Após o período da revolução industrial, muitas cidades europeias testemunharam um crescimento em ritmo acelerado, intensificado pelo movimento das pessoas do campo para os centros urbanos na busca por maiores oportunidades.
Mas, se de um lado as cidades tornavam-se cada vez mais atrativas, também se intensificaram problemas como a poluição e o crescimento das ocupações irregulares. Em outro contexto, se o campo permitia o contato próximo à natureza e uma abundância de recursos naturais, também sofria com certo isolamento e redução nas possibilidades de emprego.
Com essas questões em vista, surge, na virada entre o século XIX e XX, o conceito das cidades jardim. Este modelo de planejamento caracterizou-se por ideais progressistas para solucionar os problemas decorrentes do êxodo rural e consequente crescimento desordenado dos centros urbanos. A concepção das cidades jardim envolveria a criação de uma série de pequenas cidades capazes de combinar, simultaneamente, os benefícios de ambos os contextos.
Ebenezer Howard (1850-1928), estudioso das cidades antes do firmamento do urbanismo enquanto campo disciplinar, foi um dos principais nomes por trás do desenvolvimento do conceito de cidade jardim. Howard foi autor da publicação To-morrow a Peaceful Path to Real Reform (1898), livro editado e lançado quatro anos depois com o título Garden Cities of Tomorrow (1902), pelo qual tornou-se largamente conhecido.
Além das publicações, Howard contribuiu para a formação da Garden City Association na Inglaterra em 1899, como uma maneira de difundir ideias em torno das ideias de justiça social, eficiência econômica, embelezamento, saúde e bem-estar no contexto do planejamento urbano que advogava em seus livros.
Particularmente emblemático no que diz respeito à síntese das ideias das cidades jardim, o Three Magnets Diagram (Diagrama de três ímãs), ocupa as primeiras páginas de Garden Cities of Tomorrow desde a sua primeira versão. Nele, cada um dos ímãs ilustrados representa uma localidade: a cidade, o campo e a cidade jardim. Enquanto os dois primeiros ímãs reúnem, em cada um dos pólos, aspectos negativos e positivos desses contextos específicos, o terceiro agrupa benefícios de ambos.
Neste terceiro ímã, as promessas das qualidades da cidade jardim soam tão promissoras a ponto de deslocar seu título para o centro do diagrama, diferentemente dos dois primeiros, como se indicasse uma forte atração entre a pergunta “The people: where will they go?” (“Pessoas: para onde irão?”) e as inúmeras qualidades oferecidas por este modelo de planejamento urbano.
“No início do século XX, duas grandes novas invenções tomaram forma diante dos nossos olhos: o avião e a Cidade Jardim, ambos presságios de uma nova era: o primeiro deu ao homem asas e o segundo prometeu-lhe um lugar melhor para habitar quando descesse à terra.” - Lewis Mumford (1946)
A visão utópica por trás do conceito idealizava pontos específicos que caracterizariam as cidades jardim. Entre eles, o planejamento de cidades em menor escala que acomodassem habitações, indústria e agricultura, circundadas por cinturões verdes, que limitariam seu crescimento. Como ilustram muitos dos diagramas e mapas desenvolvidos para cidades jardins, a concepção de uma rede interligada entre elas também se configura como um ponto importante para sua efetivação.
A aplicação do conceito foi observada em cidades inglesas como Letchworth, Welwyn e Stockfeld, mas também em outras cidades dentro e fora do continente europeu, com adaptações e reinterpretações do modelo à medida em que surgiam novos contextos geográficos e históricos.
Ainda hoje, o conceito tem sido retomado - ainda que com um grande distanciamento em relação à concepção original - para identificar certas propostas urbanísticas que buscam, ao menos na teoria, uma maior integração do contexto urbano com áreas verdes.
Mas, se por um lado os afastamentos teóricos e conceituais entre o conceito lançado por Howard e as classificações de muitas propostas recentes no campo do planejamento urbano reforçam as suas disparidades, também enfatizam a relevância do estudo e compreensão do conceito de cidade jardim ainda hoje.
Referências bibliográficas
- HOWARD, Ebenezer. Garden Cities of Tomorrow. Londres: Swan Sonnenschein & Co. Ltd., 1902.
- MUMFORD, Lewis. The Garden City Idea and Modern Planning. In: HOWARD, Ebenezer. Garden Cities of Tomorrow. Londres: Faber and Faber, 1946.
- ROSS, Rebecca; MOGILEVICH, Mariana; CAMPKIN, Ben. Ebenezer Howard's three magnets. The Guardian, 05 dez. 2014.